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por Luciana Saddi

Perfil Luciana Saddi é psicanalista e escritora

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Psicanálise de bebês e crianças pequenas - Entrevista

Por Luciana Saddi
30/07/13 09:31

A psicanálise de crianças começou a se desenvolver a partir da segunda década do século XX. Seus dois maiores expoentes iniciais foram Anna Freud e Melanie Klein, que criou a técnica da ludoterapia. Quase cem anos depois, observamos um desenvolvimento assombroso dessa disciplina e hoje, podemos tratar de bebês e crianças pequenas, favorecendo a profilaxia de transtornos mentais graves. Vamos conversar com, Maria Cecília Pereira da Silva*, que coordena um curso** sobre a clínica de 0 a 3 anos, no Centro de Atendimento Psicanalítico da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.

Luciana: Como foi que você se interessou pelo trabalho analítico com bebês e crianças pequenas?

Maria Cecília: Ao estudar Psicopatologia do Bebê, com Serge Lebovici, descobri como intervenções nas relações iniciais pais/bebês, em poucas consultas, podiam fortalecer as funções parentais e solucionar sintomas de sofrimento emocional no bebê.

Evitar que dificuldade vinculares e sintomas se cristalizem é extremamente preventivo e profilático. E isso é apaixonante. Assim podemos ajudar psicanaliticamente, em poucas consultas, muitas pessoas. 

Luciana: Quais as especificidades desse trabalho?

Maria Cecília: O trabalho se realiza preferencialmente nos primeiros 3 anos do bebê conjuntamente com os pais e outros irmãos. Eventualmente trabalhamos com os avós e babás também. As sessões duram entorno de 1 hora e podem ocorrer entre 4 e 10 sessões ou mais, dependendo da situação, e não, necessariamente, são semanais. Muitas vezes atendemos em co-terapia. Ou seja, 2 terapeutas para favorecer a continência oferecida à família.  Às vezes propomos uma puericultura emocional e vamos acompanhando de tempos em tempos a interação e o desenvolvimento emocional do bebê. 

Luciana: Quando pais, profissionais e cuidadores devem procurar a avaliação de um psicanalista?

Maria Cecília: Quando há dificuldades vinculares, dificuldades no sono ou alimentação, problemas com controle esfincteriano, irritabilidade, excesso de agitação, dificuldades na interação afetiva  e intersubjetivas   

Luciana: O que mudou no campo da clínica de 0 a 3 anos, considerando os últimos 50 anos?

Maria Cecília: Cada vez mais cedo somos capazes de identificar transtornos do espectro autista e intervir precocemente muitas vezes impedindo a cristalização dos sintomas mais sérios. 

Luciana: Por que o diagnóstico de transtornos do espectro autista (TEA) vem crescendo no mundo todo?

Maria Cecília: Em primeiro lugar porque aumentou o número de crianças com TEA e com isso os pesquisadores começaram a buscar sinais precoces desses transtornos. Estudam-se filmes caseiros de crianças diagnosticadas com TEA e a qualidade das interações intersubjetivas entre pais e bebês, assim como a disponibilidade emocional materna.

Antigamente, os pediatras só encaminhavam quando os sintomas se mantinham após os 3 anos e alguns, após os 6 anos ou quando os pais identificavam algo estranho e comparavam seus filhos com as outras crianças da escola.  Hoje, as pesquisas mostram que a plasticidade cerebral permite que intervenções precoces transformem neurológica e emocionalmente quadros que mais tarde se tornariam crônicos.  

Luciana: Como vê a influência do mundo atual nos sintomas das crianças?

Maria Cecília: Cada vez mais cedo as crianças são expostas a brinquedos e atividades tecnológicas em detrimento do contato humano e algumas acabam estabelecendo uma preferência maior por objetos do que pela interação com seres humanos, dificultando o desenvolvimento de relações intersubjetivas e a mediação dos sentimentos e emoções. 

A falta de redes parentais nas cidades grandes também deixa as mães muito desamparadas com a chegada de um bebê. Tanto os pais quanto os avós e comadres são importantes para embalar a dupla mãe-bebê nos momentos de estresse da mãe.  

A disponibilidade emocional materna entra em disputa com as demandas cotidianas e contemporâneas, além das demandas profissionais, exigindo que as crianças se tornem rapidamente independentes e autônomas. Essa precocidade, muitas vezes, se transforma em sintomas como: fobias, obesidade, ecoprese, retraimento ou momentos de explosividade.

*Maria Cecília Pereira da Silva é Psicanalista, membro efetivo, analista de criança e adolescente e docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, filiada à International Psychanalytic Association. Especialista em Psicopatologia do Bebê pela Université Paris XIII. Pós doutora em Psicologia Clínica pela PUC-SP. Membro do Departamento de Psicanálise de Criança e Professora do Instituto Sedes Sapientiae. Coordenadora da Clínica 0 a 3 do Centro de Atendimento Psicanalítico da SBPSP. Autora dos livros, A paixão de formar e Herança Psíquica (casa do psicólogo), A construção da parentalidade em mães adolescentes (honoris causa) e Organizadora do livro, Sexualidade começa na infância (casa do psicólogo).

**Curso aberto a profissionais e estudantes das áreas de educação e saúde (psicólogos, pediatras, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, enfermeiros, terapeutas ocupacionais entre outros). Será ministrado durante o segundo semestre de 2013, em 8 aulas, com uma hora e meia de duração e frequência quinzenal, às sextas-feiras das 13h00 às 14h30. Informações: (11) 3661-9822 ramal 1, de 2ª a 6ª das 9h00-16h00.

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O favorito da mãe

Por Luciana Saddi
29/07/13 09:41

Internauta: Você acredita que quando alguém foi o favorito indiscutível da mãe conserva aquele sentimento de conquistador e a confiança no sucesso, que não raro traz realmente o sucesso?

Luciana: Só acredito se o favorito não desenvolver uma baita culpa pelo favoritismo. Há casos dessa natureza que confirmam sua observação: autoconfiança elevada e sucesso. Mas há casos em que o sentimento de culpa inconsciente sabota qualquer chance de desenvolvimento.

Ser o favorito da mãe nem sempre é bom, pois a exclusão dos irmãos ou do pai está implicada nessa preferência, elevando o sentimento de culpa por prejudicar os familiares amados. E muitas vezes, a mãe em sua ânsia por amar o tal filho acaba por ofertar apenas uma superproteção sufocante.

 

Poema à Mãe 

 

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe

Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!

Olha — queres ouvir-me? —
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;

ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;

ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal…

Mas — tu sabes — a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.

Eugénio de Andrade, in “Os Amantes Sem Dinheiro”.

Aurea Rampazzo, coordenadora das oficinas de criação literária do Museu Lasar Segall, escolheu o poema para essa pergunta/resposta.

Dica: Psicose, obra prima de Alfred Hitchcock. Mostra que o complexo de édipo, deve ser superado para o bem de todos os envolvidos.

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Palavra em cena - Podcasts contam a história do teatro

Por Luciana Saddi
28/07/13 10:04

A partir de hoje, e a cada 15 dias, o portal da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco leva ao ar uma série de podcasts, intitulada, Palavra em cena. Nela, o diretor e dramaturgo, Maurício Paroni de Castro, convida o ouvinte a uma viagem histórica, rumo a palavras, sons e conceitos cênicos do passado, ligados diretamente com visões prosaicas do presente. 

A apresentação e criação de Paroni lança mão da paradoxal distância e proximidade da nossa vida cotidiana com o assunto enfocado. Nas gravações, participações especiais de aprendizes, formadores e convidados especiais. A locução inicial é de Sylvia Soares.

Neste primeiro programa, o diretor fala do seu principal objetivo com a série: “A Palavra em cena são palavras, ondas, que ordenadas segundo uma gramática retórica, como descrita por Sócrates, transmitem emoções, significados, vivências, convicções, contradições. Tudo coordenado diante de um público. Tudo. Muito diferente de um presépio de luzes, feéricas ou sombras terrificantes, animadas e elaboradas fora da visão do público. Boa viagem”.

Ouça o primeiro programa da Palavra em cena:

 http://spescoladeteatro.org.br/audios/introducao-palavra-em-cena.mp3

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Entenda como o álcool leva à perda da humanidade

Por Luciana Saddi
25/07/13 10:37

Os jovens entram em contato com a bebida alcoólica e com as drogas cada vez mais precocemente em nosso país. “Quanto mais cedo se dá esse contato, maior a chance de desenvolver abuso ou dependência”, afirma a psicanalista e blogueira da Folha Luciana Saddi.

Especialistas afirmam que pelo menos 20% da população tem uma relação perturbada com o álcool.

Psicanalistas consideram o alcoolismo não apenas como toxicomania ou como comportamento adictivo.

“Eles tendem a ver o processo que leva à dependência como um processo de busca por um estado ideal de onipotência e completude, um culto ao álcool e às drogas, uma religião degradada, que gera perda da humanidade”, diz.

http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/2013/07/1304452-luciana-saddi-entenda-como-o-alcool-leva-a-perda-da-humanidade.shtml

O conteúdo desse post foi baseado no livro, Idealcoolismo: um olhar psicanalítico sobre o alcoolismo, de Antonio Alves Xavier e Emir Tomazelli (ed. Casa do Psicólogo).

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Gênesis

Por Luciana Saddi
24/07/13 10:01

Mais uma crônica minha no site Visionari:

http://visionari.com.br/atitude/cronicas/luciana-saddi/item/440-gênesis

 

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Neurose de destino

Por Luciana Saddi
23/07/13 09:54

Há pessoas que vivem perseguidas por um destino funesto – como se houvesse uma força demoníaca marcando sua existência. Falamos de uma crença em algum tipo de fracasso ou sofrimento que, antecipadamente, modela o futuro. Benfeitores que acreditam que sempre serão pagos com a ingratidão. Amigos constantemente traídos. Mulheres mal amadas ou usadas continuamente, porque estão destinadas a se apaixonarem pelos homens errados. Pessoas que têm certeza que nunca terão sucesso nos negócios, apesar dos esforços ou que não se sairão bem nos estudos.

Acreditam que a qualquer momento, a vida lhes dará uma rasteira. Vivem com medo do dia em que essas fantasias se realizarão. Fantasias alimentadas por episódios cotidianos ou excepcionais, que se repetem, e confirmam a expectativa de ruína.

Quando a ruína se concretiza, falam: – bem que eu sabia que isso ia acontecer ou não nasci para isso, eu sabia! De novo? De novo!

Mas não chegam, exatamente, a se surpreenderem com o fracasso ou infelicidade, sentem alivio, pois o destino se cumpriu conforme o mandamento interior.

É de se perguntar o quanto crenças e fantasias tão arraigadas contribuem para a repetição do destino funesto. Quem sempre espera, acaba por alcançar, diria o senso comum. Pode ser verdade. A Psicanálise nos ensina que o medo do êxito é poderoso, é influenciado pelo sentimento de culpa inconsciente que exige punição e castigo e, muitas vezes, sobrepuja o desejo de sucesso.

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Blog de cinema da Eleonora - entrevista

Por Luciana Saddi
22/07/13 09:30

Um blog de cinema comandado pela psicanalista, Eleonora Rosset, desde 2009. Vale a pena visitar o blog e ler suas análises e comentários sobre os filmes.  http://www.eleonorarosset.com.br/

Luciana: Por que um blog de cinema?

Eleonora: Porque eu sou apaixonada por cinema desde criança. E como eu também gosto de escrever, uni dois prazeres no blog.

Luciana: Como e quando surgiu a vontade de realizar seu blog?

Eleonora: Tudo começou em 2009 quando minha amiga Marta Suplicy, candidata ao Senado, lançou o MPOST , jornal na internet que acompanhava a campanha dela. Ela me convidou para fazer uma coluna de cinema porque eu havia escrito um texto sobre o filme do Woody Allen(“Vicky, Cristina, Barcelona”) que ela tinha gostado. Eu hesitei, porque achava que era muita responsabilidade prometer escrever um texto por semana. Mas, ao contrário do que eu pensava, gostei da experiência e do retorno de pessoas que liam meus textos e  me incentivavam a continuar escrevendo.

Luciana: Como é seu ritmo de trabalho no blog, quantos filmes assiste por semana?

Eleonora: Eu faço duas postagens por semana. Às vêzes mais, por exemplo, quando é época do Oscar e os filmes são lançados no Brasil em cima da hora. Acompanho também os outros prêmios internacionais, SAG Awards, Globo de Ouro, BAFTA, contando como foi a noite da cerimonia e quais foram os atores e filmes premiados.

E no Face coloco todo dia alguns comentários sobre o filme da vez. Isso estimula as pessoas a ler a minha resenha no blog e a ver o filme no cinema. Acho importante criar um gosto pelo cinema nas plateias brasileiras. Faço também reportagens sobre os festivais de cinema no Face, como Cannes, Berlim e Veneza. Estou sempre falando de cinema no Face e as pessoas gostam.

E vejo pelo menos três filmes por semana. Porque eu só coloco filmes dos quais eu gostei. Claro que há filmes maravilhosos e outros nem tanto. Mas meu objetivo é fazer com que as pessoas vejam mais filmes para, inclusive, desenvolver um gosto e conhecimento pelo cinema, que eu acho que é a mais contemporânea das artes, podendo se utilizar de todas as outras.

Luciana: Você é psicanalista, quais a relações entre psicanálise e cinema?

Eleonora: O cinema e a psicanálise sempre se deram bem. Há diretores que usam as ideias da psicanálise para contar as histórias de seus filmes que assim ganham profundidade e relevância. Bunuel, Bergman, Alain Resnais,Woody Allen, Lars Von Trier, Michael Haneke, Terrence Malik e outros fizeram filmes antológicos e contribuiram para divulgar ideias psicanalíticas. Mas para mim, acho um pouco chato para o público leigo, ler interpretações psicanalíticas de filmes. Isso é interessante para os profissionais, nossas revistas e congressos.

Luciana: Qual a influência do cinema na sua vida e no seu trabalho?

Eleonora: Eu não consigo viver sem o cinema. E é difícil acompanhar meu ritmo porque, se eu pudesse, veria quase todos os filmes em cartaz e ainda reveria muitos filmes antigos. Gosto de fazer maratonas de diretores ou de atores e atrizes. Mas tem o meu trabalho no consultório, a familia, os amigos, a vida fora do cinema. Vejo menos do que gostaria mas aproveito demais do cinema. Cinema é sonho. E sonho é matéria prima da psicanálise. Gosto de pensar que vejo os filmes através de uma personalidade moldada pela psicanálise e portanto, algumas das coisas que me atingem durante o desenrolar do filme, é como se eu estivesse numa sessão com uma pessoa. Acolho dentro de mim e quando vou escrever  aparecem elaborações provocadas pelo filme em mim.

O cinema me enriquece. É uma janela privilegiada sobre a natureza humana e o mundo em que vivemos.

 

 

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Sentimento de inferioridade pode levar à depressão

Por Luciana Saddi
21/07/13 09:00

No programa “Fale Comigo” desta semana, a blogueira da Folha Luciana Saddi fala sobre o sentimento de inferioridade.

Segundo a especialista, quando o sentimento de inferioridade se organiza a ponto de dominar a vida psíquica de alguém, a neurose se estabelece.

“Muitas vezes surge a depressão como consequência dessa constante opressão e descrença em si mesmo”, explica Luciana.

http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/2013/07/1304453-luciana-saddi-sentimento-de-inferioridade-pode-levar-a-depressao.shtml

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Ku - de J.B. de Souza Freitas

Por Luciana Saddi
19/07/13 09:07

Por uma tarde sombria,/ na aldeia de Kampanu,/ um pequeno ser nascia,/ com o lindo nome de Ku.

Bem mais ou menos assim em tempos aqueles de ginásio principiava poeminha que com mafiosa precaução circulava entre nós, novéis ginasianos, iniciantes nos mistérios e meandros dos signos e palavras incumbidos de sinalizar e conduzir o intrincado transitar de um ser falante no mundo que o rodeia.

O ponto nevrálgico daquela nossa sigilosa operação centrava-se naturalmente no Ku. Camuflado por inusitada consoante, o monossílabo ganhava certa graça e exotismo e mantinha o som e a fúria do proibido similar grafado com C, considerado palavrão de arrepiar e requerente mesmo de imediata esfregação da boca de qualquer pronunciante com escova preferencialmente de aço.

Tirante tal secreta peça versificada, cujo acesso era exclusividade do alunado masculino, episódio outro envolvendo o proscrito monossílabo já ocorrera. A céu aberto (ao alcance portanto dos olhos e ouvidos da ala feminina) e (pode-se dizer) de caráter além-fronteiras.

Pela terceira ou quarta aula de francês, no fundão da classe, o repetente Edival (bom em letras, fraco em números) desafiou pra ato de valentia o valoroso Vieira: indagar no idioma de Voltaire e Brigitte Bardot o significado da palavra pescoço (é, é, pescoço, sussurrava Edival, a apontar a própria goela).

Certificado pelo veterano colega que se tratava de teste pra avaliar o nível de conhecimento daquela nova e jovem professora, levantou Vieira em momento azado a mão e enunciou em bom e claro som a relevante questão.

Mademoiselle Yvonne (portava a mestra nome que evocava a França e letra de tango) pôs-se roxa-rabanete (que tempos!) –, mas firme se manteve.

Foi até o quadro negro e escreveu: COU. Voltou-se para o inquisidor Vieira e esclareceu: pescoço em francês se escreve assim; ao ser pronunciado, o O é omitido. E o senhor faça o favor de se retirar da sala.

Força por oportuno registrar: em meados aqueles de 1950, Cu era um negócio que os comportados (e raros) dicionários dificilmente davam, a não ser sob a forma insípida e até decepcionante de símbolo do cobre, do latim cuprum.

Pra valer, tal como hoje se escancara, nem pensar. Orifício na extremidade inferior do intestino grosso. Bunda, rabo, traseiro. Conjunto das nádegas e do ânus.

Curiosos (a propósito) são os caminhos da semântica: nessa última acepção, o termo é de corrente e familiar uso em plagas lusitanas.

Em igualmente outrora ocasião, falecido tio meu ao em Lisboa chegar com a família (ele, mulher e três filhos) estupefato (como outrora acontecia) ficou ante o palavrear do motorista do táxi que os levaria ao hotel.

Fosse digamos em Congonhas, a indicação pra que primo Zezo (o caçula, em seus incompletos dez anos) se acomodasse um tanto espremidamente no meio do banco da frente seria (em nossos sempre carinhosos diminutivos) talvez assim: “O menininho, que tem a bundinha mais pequeninha, vai ficar sentadinho aqui”. Roupa outra, no entanto, vestiu aquele comandar em luso e destampado vernáculo: “Ó, puto, tu que tens o cu mais estreito senta-te aqui”.

Certo que brasilicamente o substantivo masculino (composto tão só pela segunda consoante e pela última vogal) em questão ora circula com mais liberdade e desenvoltura.

Tomar no próprio, tirar da seringa o próprio e ficar com o próprio na mão já não constituem motivos de ohs! de incredulidade e puro  horror.

Quem se dispuser a percorrer o Dicionário do palavrão e termos afins, de Mário Souto Maior, espantar-se-á (valha a mesóclise) com a quantidade de derivações ali registradas. A partir de anel de couro, argola, bozó, canal dois, ceguinho, dentrol, passa-se por fiantã, fiofó, loló, lordo, quo-vadis e chega-se a padaria, retaguarda, rigoleto, tarraqueta, xandongas, zebesquefe e zorobó.

Quanto ao personagem que nomeia o presente texto, pesa-nos confessar que nos fugiu da memória o transcorrer exato de sua movimentada e trocadilhesca vida.

O que com certeza lembramos foi de seu trágico fim: em batalha no qual envolvido, certeiro tiro de poderoso rifle mortalmente atinge o olho do Ku.

 

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O excesso é uma das marcas da atualidade: hiper vaidade

Por Luciana Saddi
18/07/13 10:40

Em busca frenética pela beleza, juventude e magreza exageramos nos recursos cosméticos e cirúrgicos. O excesso é uma das marcas da atualidade. Também o excesso de exposição a imagens. Imagens trabalhadas, mostrando corpos e rostos sem nenhum esconderijo ou véu, a ponto de se tornarem invasivas.

Podemos afirmar que nos encontramos em tempos de hiper vaidade. Não apenas porque o Brasil é um dos países que mais realiza cirurgias plásticas no mundo e, cada vez mais, aumenta o consumo de produtos da indústria estética. Mas, principalmente, porque somos bombardeados por imagens que nos induzem        a ideais de força física, beleza e perfeição das formas. Essas imagens se parecem com as da propaganda nazista, impondo ideais estéticos e padrões de saúde que excluem a população em geral. Temos então pessoas que se sentem superiores, porque acreditam estar de acordo com esses padrões, e uma grande maioria que se sente inferior. Os inferiores tentam se torna superiores.

A ideologia que sustenta esse massacre das imagens supostamente belas e saudáveis não é mais a nazista, embora haja semelhanças. A ideologia que impera hoje é a do mercado, indústria e lucros. Ideais, mesmo os de saúde no campo das ciências, parecem ser tão manipuláveis como as imagens que são modificadas pela tecnologia e nos causam inveja, constrangimento e vergonha.

Certa vez o grande escritor húngaro, Kertész, sobrevivente de campo de concentração nazista, afirmou que continuava vivendo num campo, mesmo estando fora há tantos anos, porque o mundo inteiro parecia ter se tornado um grande campo nazista.

 

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