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por Luciana Saddi

Perfil Luciana Saddi é psicanalista e escritora

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A mentalidade de dieta II

Por Luciana Saddi
29/08/13 11:10

A alimentação vem sendo compreendida pela psicanálise como uma forma de comunicação e de relação entre as pessoas, forma altamente investida tanto individualmente quanto socialmente. Comer é um grande ato acompanhado por muitos toques de requinte cultural e psicológico. Satisfaz a fome e o desejo, a primeira mamada entrelaça necessidade e prazer – ato carregado de componentes eróticos altamente sofisticados. Por isto, muitas vezes, o método de dieta falha: porque não leva a vida psíquica em consideração nem os sinais vitais do comer e porque foi engendrado sob a configuração social chamada ato puro*, em substituição ao pensamento. Para quem teve a alimentação perturbada, é preciso um trabalho psicológico minucioso de investigação sobre a própria alimentação.

Sabemos que comer dá trabalho. É um ato complexo, que envolve capacidade de decisão, de percepção dos sinais internos, de escolha, de relação com o outro e com o mundo de forma mais ampla. As dietas negam isso: tratam o homem como se fosse gado, como se comesse ração, como se, via tecnologia, pudessem alterar o corpo, o paladar e até mesmo o gosto e a forma humana. A ciência e a indústria produzem enorme perturbação ao intermediar de forma massificante a relação do homem com sua alimentação. Diante das condições descritas aqui, vemos que o homem foi perdendo progressivamente a autonomia alimentar possível, já que perdeu a capacidade de se perceber diante do alimento e da alimentação. Procurando se enquadrar desesperadamente em algum “manual da boa alimentação”, acabou por abandonar o trabalho interno que comer exige. E repete essa mesma situação ao procurar transformações em seu corpo, que passa a ser tratado como maquina, como um objeto externo ao próprio homem. Ao fazer dieta constantemente e ao buscar um corpo idealizado se torna mais vulnerável a desenvolver algum problema alimentar.

Vejamos a definição desses quadros sintomáticos.

Os problemas alimentares:

A) Distúrbios do ritmo alimentar:

1. Distúrbio compulsivo de alimentação, que pode levar a obesidade ou não, mas que inicialmente é definido como toda a alimentação além da saciedade.

2. Bulimia, alimentação excessiva combinada a técnicas de alívio, como vômitos e evacuações e diurese forçadas.

3. Anorexia, fobia intensa a gordura e a alimentos, que pode gerar um emagrecimento severo e contínuo.

B) Preocupação exagerada com a aparência do corpo, com exercícios físicos, dietas constantes, modas alimentares, toda a ordem de compulsão por transformações estéticas no corpo.

C) A desnaturalização do ato de comer, mediado por tantas informações, torna a alimentação fonte de desconforto, de mal-estar, fundando uma relação perturbada com o alimento, com a saúde e com o corpo.

Os problemas alimentares acima identificados indicam um grau acentuado de perda de autonomia alimentar em consequência da mentalidade de dieta.

A mentalidade de dieta:

Diante de um prato de comida, de um buffet ou mesmo da fome, encontramos pessoas perdidas, tentando contar calorias, saber o que é cientificamente permitido e emitindo as mais criativas opiniões sobre os alimentos e a alimentação. Opiniões que parecem lastreadas em artigos científicos publicados em jornais ou revistas. Vale notar que esses “artigos científicos” de última moda descobrem propriedades exóticas nos alimentos ou mudam de opinião a cada semana. Mesmo assim ou por causa disso, estamos desconectados do ato de saciar a fome com o alimento saboroso de nossa escolha e com a quantidade que sentirmos ser suficiente. Nossa sociedade desaprendeu a comer, teme comer ou nem mesmo se permite comer e investigar a própria alimentação. Mediados por informações diferentes, nos encontramos perdidos diante do controle produzido por esses intermediários: ciência, meios de comunicação, propaganda, moda, indústria, família e escola, que criam ou propagam essa nova moralidade e produzem a mentalidade de dieta – a consequência é perda de autonomia do homem em relação a sua alimentação. A autonomia alimentar ocorre quando a alimentação é guiada pelos sinais vitais internos, pela percepção da fome, pela escolha livre do alimento desejado para aquele momento de fome e pela percepção do sinal de saciedade. É importante perceber quando usamos os alimentos para aplacar sentimentos, a comida deveria apenas aplacar a fome. Quando é usada para tapar uma falta ou diminuir uma ansiedade difusa, se torna um péssimo remédio, pois produz efeitos colaterais desagradáveis.

Mentalidade de dieta é um termo que se refere a uma política de controle típica da sociedade de massa de consumo – controle exercido sobre nossos corpos e gostos -, que nos aliena dos sinais vitais da alimentação: fome, saciedade e prazer em comer. É a causa de grande parte dos problemas alimentares, e não sua cura. Significa que o ato de alimentar-se deixa de ser uma decisão pessoal, impõe-se de fora, tomando o lugar do pensamento.

A mentalidade de dieta perturba os sinais vitais da alimentação – pessoas submetidas cronicamente a dietas costumam não saber se sentem fome e não reconhecem o sinal de saciedade. Alimentam-se rapidamente, procuram ingerir os alimentos “proibidos” em grandes porções, pois nunca saberão quando poderão usufruir desse prazer novamente. São como condenados a morte diante de sua última refeição. É que estão submetidos à privação de prazer e à privação calórica, o que os torna propensos ao distúrbio compulsivo de alimentação. Onde há privação, haverá compulsão.

*conceito do psicanalista, Fabio Herrmann, sobre as regras do mundo em que vivemos, quando o ato toma o lugar do pensamento.

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Gracias a la vida

Por Luciana Saddi
28/08/13 09:41

É comum pensarmos que os pais revivem sua própria infância na de seus filhos e netos. Os que tiveram condição de usufruir dos prazeres da vida parecem mais capazes de acreditar e investir na continuidade da mesma.

Entender que novas gerações serão lançadas ao mundo, que fazemos parte da grande família humana, tendo em comum uma espécie de árvore genealógica sem fim, se torna fundamental para suportar o envelhecer e a finitude.

Resignação à passagem do tempo e ao caráter transitório da vida se faz necessário para aproveitar a presença dos pequenos e com eles sentir um bom gosto de infância.

A felicidade experimentada quando somos crianças e o amor pelos cuidadores enriquecem a nossa personalidade e se tornam uma base de apoio importante no envelhecimento. Dizia Goethe: O mais feliz dos homens é aquele que pode harmonizar o fim e o começo de sua vida.

Estabelecer dentro de si, com firmeza, a capacidade de amar mitiga as perdas e privações da vida adulta. A generosidade com as crianças e com as novas gerações se faz possível dentro dessa perspectiva amorosa. A gratidão é sua mais fina e elevada expressão, talvez por isso, seja o mais raro dos sentimentos. Implica em aceitar não ter nem ser tudo e também aceitar receber algo bom de alguém, que deu porque quis, por amor e bom grado. Dai só nos resta agradecer a vida que tanto nos deu

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Recém-nascidos podem fazer terapia

Por Luciana Saddi
27/08/13 09:08

Fale comigo na Folha Multimídia 

No programa “Fale Comigo” desta semana, a psicanalista e blogueira da Folha Luciana Saddi fala sobre a intervenção precoce nas relações iniciais entre pais e bebês.

Segundo a especialista, é possível realizar consultas terapêuticas para pais, bebês e crianças pequenas quando esses apresentam transtornos que indicam dificuldades nos vínculos iniciais.

Entre os sinais de que algo não está indo bem com o bebê estão distúrbios de sono, problemas na alimentação, extrema agitação ou irritabilidade, além de choro contínuo, indiferença aos cuidadores ou atrasos na fala e no desenvolvimento motor.

Saiba mais sobre a intervenção de um especialista e como ela é indicada, ouvindo o áudio abaixo.

http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/2013/08/1332122-luciana-saddi-recem-nascidos-podem-fazer-terapia.shtml

Este post foi elaborado a partir de textos da psicanalista, Maria Cecília Pereira da Silva, que coordena um curso sobre a clínica de 0 a 3 anos, no Centro de Atendimento Psicanalítico da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.

Informações: (11) 3661-9822 ramal 1, de 2ª a 6ª das 9h00-16h00.

Entrevista no blog sobre o tema:

https://falecomigo.blogfolha.uol.com.br/wp-admin/post.php?post=1654&action=edit

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No mundo da lua

Por Luciana Saddi
26/08/13 10:12

Internauta: Tenho 46 anos e vivo no mundo da fantasia desde os 10. Sou um pouco estrábico, na adolescência era pior, e isso me deixava muito retraído e complexado. Talvez por isso eu fugisse para as fantasia. Não consigo sentir prazer na realidade. Nas minhas fantasias, sempre sou famoso, não importa o setor, às vezes sou um ator, um cantor, etc. Sempre que vejo alguém fazendo sucesso na mídia me imagino tão ou mais importante do que essa pessoa. Em meus devaneios, tenho muitas mulheres famosas. Gostaria de viver a realidade e parar de sonhar. 

Luciana: não há motivos para não odiarmos a realidade – como diz o ditado: a realidade dói. Alguns aprendem a conviver com a dor e com as perdas próprias da vida, outros permanecem emaranhados no maravilhoso, rejeitando aspectos dolorosos da vida, acreditando que os pequenos êxitos do cotidiano caem do céu e não são frutos nem do trabalho nem do empenho nem da paciência e muito menos do estudo.

O mundo de fantasias – devaneio é a palavra correta – invade a vida diurna e toma conta de muitas tarefas cotidianas, quando a intolerância à frustração é exagerada. Ao não aguentarmos a dura realidade que nos confronta com as dificuldades, fugimos para um lugar idílico, onde somos reis. É como se você vivesse se masturbando o tempo todo – pena, nunca irá conhecer o prazer de estar com uma mulher. Para começar a viver a realidade é preciso amar algo ou alguém de carne e osso, investir,  se entregar e aguentar as consequências disso – coragem.

Todos temos uma espécie de reserva florestal (o inconsciente) de onde retiramos a matéria bruta para o trabalho criativo; os escritores, artistas, cientistas retiram dessa reserva experiências de prazer e de livre imaginação. É um material de trabalho muito rico quando transformado pelo labor humano. A mistura de imaginação com transformação pragmática pelo trabalho cria a riqueza de grande parte da produção humana. Já a fantasia pura afasta qualquer um do viver e do compromisso de criar e trabalhar.

 

Sob uma estrela pequenina

Me desculpe o acaso por chamá-lo necessidade.
Me desculpe a necessidade se ainda assim me engano.
Que a felicidade não se ofenda por tomá-la como minha.
Que os mortos me perdoem por luzirem fracamente na memória.
Me desculpe o tempo pelo tanto de mundo ignorado por segundo.
Me desculpe o amor antigo por sentir o novo como primeiro.
Me perdoem, guerras distantes, por trazer flores para casa.
Me perdoem, feridas abertas, por espetar o dedo.
Me desculpem os que clamam das profundezas pelo disco de minuetos.
Me desculpem a gente nas estações pelo sono das cinco da manhã.
Sinto muito, esperança açulada, se às vezes me rio.
Sinto muito, desertos, se não lhes levo uma colher de água.
E você, falcão, há anos o mesmo, na mesma gaiola,
fitando sem movimento sempre o mesmo ponto,
me absolva, mesmo se você for um pássaro empalhado.
Me desculpe a árvore cortada pelas quatro pernas da mesa.
Me desculpem as grandes perguntas pelas respostas pequenas.
Verdade, não me dê excessiva atenção.
Seriedade, me mostre magnanimidade.
Ature, segredo do ser, se eu puxo os fios das suas vestes.
Não me acuse, alma, por tê-la raramente.
Me desculpe tudo, por não estar em toda parte.
Me desculpem todos, por não saber ser cada um e cada uma.
Sei que, enquanto viver, nada me justifica
já que barro o caminho para mim mesma.
Não me julgues má, fala, por tomar emprestado palavras patéticas,
e depois me esforçar para fazê-las parecer leves.

 

Wislawa Szymborska, poeta polonesa que ganhou o Nobel de Literatura em 1996.

 

Dica: A rosa púrpura do Cairo, filme de Woody Allen. Como sair da tela, deixar de ser pura imagem para se tornar de carne e osso, frágil e mortal? Os poetas recomendam o amor, como uma poção mágica, para realizar essa transição.

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Ciúme

Por Luciana Saddi
22/08/13 10:05

Diz respeito ao amor que alguém crê que lhe é devido e que lhe está sendo tirado.  Amor que corre perigo por conta de um rival. Algo como: alguém me priva de quem eu amo ou me priva de algo bom, que por direito é meu. Teme-se perder o que se possui. O ciúme é uma grande ameaça.

As relações triangulares estão na base do ciúme. O ciumento exige a posse completa de quem ele ama. Também requer continuamente a garantia de ser o destinatário dos afetos do amado.  Ele reconhece o bom e o bem do outro, mas teme ser colocado à parte disso. Jogos de exclusão e de preferência, acompanhados pela fantasia de estar sendo passado para trás, traído ou trocado, aterrorizam os ciumentos de modo geral.

Suspeita, dúvida e insegurança marcam as relações de quem sente o ciúme em demasia. Esses estados de perseguição têm duração e intensidade variáveis de acordo com a maior ou menor fragilidade da personalidade. A impossibilidade de confiar na permanência do ente querido está no centro desse tipo de sofrimento psíquico.

É comum o ciumento protagonizar triângulos amorosos em fantasia ou na realidade. O ciumento costuma viver assim o amor, tudo é triângulo para ele.  Por isso teme constantemente a exclusão e a traição. Afinal, se ele não confia nele mesmo, por que confiaria no outro?

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Usos e abusos

Por Luciana Saddi
21/08/13 09:47

Internauta: Meu namorado tem 34 anos e ainda mora com  a mãe. Quando saíamos ele costumava paquerar outras mulheres declaradamente, me deixando mal. Eu disse que não toparia mais namorar caso continuasse com isso, os triângulos amorosos (paqueras declaradas) pararam. Mas toda essa história tem me gerado bastante dor e sofrimento. Há possibilidade de ele melhorar esses aspectos do complexo de Édipo mesmo sendo tratado por uma abordagem sistêmica? Não posso desprezar as melhoras dele após iniciar a terapia, mas ainda vejo muitos problemas. Percebo que me preocupo mais com ele do que o contrário.

Luciana: acredito que muitos caminhos levam a Roma. Segundo sua observação a terapia dele vem dando resultados, é isso que importa. Procuramos terapia não para ficar de bem com o outro, o fundamental é que a terapia dele seja útil para ele e não para você.

A sensação de injustiça num relacionamento é frequente quando fazemos mais pela relação e pelo namorado do que devemos e não colocamos limites claros nem para nós mesmos nem para ele. A questão é entender os motivos que levam você a  essa atitude de doação (sempre vem a cobrança quando o sentimento de ser usada emerge), de suportar dor e sofrimento indesejados. É mesmo necessário pagar caro para ter um namorado? Se é necessário, quais os benefícios que você alcança com isso? A pergunta então não dever ser feita na direção dele melhorar ou não, mas na sua direção, do que você precisa para melhorar em relação a você mesma.

 

CANTARES DO SEM-NOME E DE PARTIDAS

I

Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.

Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.

Que este amor só me veja de partida.

 

Hilda Hilst, do livro de poemas: CANTARES DO SEM-NOME E DE PARTIDAS, que ganhou o prêmio Jaboti em 1983.

 

Dica: Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres, romance da escritora Clarice Lispector, publicado em 1969. Uma bela e diferente história de amor e de descoberta de si. Para amar é preciso se conhecer, ter alguma segurança interna e abertura para o outro. E nunca se esqueça da reciprocidade.

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Entenda como a propaganda pode formar uma opinião

Por Luciana Saddi
20/08/13 07:37

Fale Comigo na Folha Multimídia

No programa “Fale Comigo” desta semana, Luciana Saddi fala sobre o ato de opinar. “Opinião comum é ato de impotência disfarçado em pensamento”, diz a psicanalista.

Para a blogueira da Folha, a opinião pública também pode ser entendida como uma opinião isolada e vertical do mundo. “É forjada por meio da propaganda, sua base de sustentação”, lembra.

A especialista explica como a opinião pode ser manipulada por meio da propaganda.

http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/2013/08/1328657-luciana-saddi-entenda-como-a-propaganda-pode-formar-uma-opiniao.shtml

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Conversando sobre o luto - entrevista

Por Luciana Saddi
19/08/13 09:53

A morte se tornou tabu em nossa sociedade tecnológica. Não há espaço para o luto nem para a dor advinda das perdas. O mal estar é tratado com medicamento, pois temos que ter eficiência maquínica. Esses temas são tratados no livro, Conversando sobre o Luto (ed.Ágora), das psicólogas, Edirrah Gorett Bucas Soares e Maria Aparecida de Assis Gaudereti Mautoni. Escrito para o público leigo, aborda conceitos científicos com linguagem fácil e objetiva.

Luciana: Como surgiu a ideia de escrever um livro sobre o luto e as perdas para o público leigo?

Maria Aparecida: Há falta no mercado editorial de livros que abordem a temática morte e luto o que dificulta aos leigos e aos profissionais da saúde o acesso a um assunto que angustia a existência humana.  A morte é um fenômeno natural da vida, e lidar com a realidade da perda para alguns pode ser tão difícil que oprime emoções por não encontrar suporte para expressar a dor da perda. Pensamos que falar de um assunto tão aterrorizante para alguns ajudaria a enfrentar a morte de parente próximo com mais naturalidade. A proposta do livro foi auxiliar as pessoas que sofrem por uma perda significante, numa abordagem simples e clara, esclarecendo sobre as reações diversas e naturais que são vivenciadas no processo de luto. Fundamentado em algumas pesquisas – de grandes estudiosos no assunto, e experiências relatadas por enlutados em processo psicoterapêutico, o livro pode ser um instrumento para trabalhar a morte no contexto hospitalar, escolar e nos lares para que crianças, adolescentes e adultos percebam a naturalidade do morrer.

Luciana: Qual a forma encontrada pelas autoras para passar ideias complexas, advindas das ciências, para a população em geral.

Maria Aparecida: Autores de renome internacional como Elizabeth Kübler-Ross, J. Bowlby, Parkes e outros citados no livro foram grandes estudiosos da temática morte, luto e perda que utilizaram relatos de familiares e experiências de enlutados para fundamentarem suas pesquisas. Ou seja, toda a fala em nosso livro foram relatos de pacientes atendidos em ambulatório hospitalar ou nos consultórios de psicologia que vivenciaram em algum momento de suas vidas a dor de perder alguém tão importante. Sentimentos como tristeza, raiva, torpor, dores musculares, e sentimento de culpa estavam presentes, porem a dor do luto é única e se diferencia de pessoa a pessoa, mas geralmente elas sentem alguns dos sintomas apresentados na literatura. A intensidade dessa dor dependerá dos vínculos afetivos construídos ao longo da vida com a pessoa morta. O luto é uma reação a uma perda significante que independente de crenças religiosas, culturais ou nível de escolaridade. Todos nos passaremos por ela um dia, sendo que uns sentirão com mais intensidade e outros com menos sofrimento. Ler, estudar ou pesquisar sobre o tema não exime de sentir a dor da perda de um animal de estimação ou a morte de um ente querido, mas ajuda a compreender os sentimentos que nos tormenta. 

Luciana: Por que a morte e as perdas se tornaram um campo tão difícil de ser abordado em nossa sociedade?

Maria Aparecida: Na Idade Média a morte era domada, morria-se por guerras ou por doenças da época. O moribundo, familiares, crianças e amigos exerciam o ritual de despedida e todos podiam lamentar a dor. A partir do século XX a morte é vista como vergonhosa, proibida de acontecer. Com a medicina e a tecnologia avançada a morte pode ser adiada, superlotando os hospitais. Quando acontece os familiares vão em busca de explicações pelo ocorrido. Denunciam como forma de negação a realidade de um processo natural que é o ciclo de vida. Não nos permitem ficar de luto pelo tempo necessário, temos que retornar a rotina do dia-dia. Com isso, o luto mal elaborado, reprimido ou adiado atormenta as pessoas, surgindo assim doenças psíquicas e físicas. A idéia do livro foi desmistificar isso, pois um enlutado pode chorar, expressar tristeza ou raiva pelo tempo necessário para passar pelo processo de luto.  

Luciana: Nesse livro percebi que há um momento em que vocês falam que toda a perda e morte trás algo positivo, discordo radicalmente dessa idéia que me parece antiga e envolta em crenças religiosas. De onde tiraram essa afirmação?

Maria Aparecida: Após uma perda de um ente querido ou de vivenciar a iminência da  morte, muitas pessoas relatam que mudaram seu sentido em relação a  vida. Muitos se aproximam de familiares e buscam na religião força para dar continuidade no viver. Elizabeth Kübler-Ross, fala que: crescemos quando ficamos doente e  podemos escolher lamentar por muito tempo ou tomar contato com o sofrimento e entende-lo como crescimento pessoal. Aprendemos diante da dor que somos seres de possibilidades e encara-la como parte da condição humana, ajuda a enfrentar outras perdas que virão. 

Luciana: O que dizer para quem perdeu um filho?

Maria Aparecida: A dor da perda de um filho é considerada como uma das maiores dores que o ser humano possa suportar. Talvez esse pai enlutado não quer que se fale algo, mas sim que se compreenda a sua dor e que se possa ficar ao seu lado para ajudá-lo no que for necessário. É uma dor que pode levar um tempo maior para ser elaborado, mas que vai passar. É importante que se respeite o tempo de cada um, e que permita expressar e  lamentar pelo tempo que for necessário.

Luciana: Como falar da morte e das perdas com uma criança, é uma questão apenas de adequar a linguagem ou deve haver uma compreensão especial do mundo infantil na hora de abordar esse assunto?

Maria Aparecida: Com certeza ao falar sobre o tema com a criança se deve respeitar o desenvolvimento cognitivo e intelectual dessa criança. De forma clara e objetiva ela deve saber o que esta acontecendo, não precisando usar uma linguagem mórbida, mas sim dizer a realidade dos fatos. No capitulo 4 damos dicas de como se deve proceder com a criança. Se for para dar uma notícia que um ente querido morreu é importante que seja por um familiar ou responsável em que a criança confia. Essa criança precisa receber segurança, que será amparada por essa pessoa cuidadora, para que não sinta sozinha em sua dor.

Luciana: No decorrer do livro, muitas vezes, vocês se utilizam da palavra normal, há alguma vantagem em normatizar a experiência pessoal, particular e intransferível da dor? Não seria mais prudente abordar a dor e suas inúmeras formas sem enquadrá-la em normas?

Maria Aparecida: Na literatura do século XX a.c., no poema do rei Gilgamesh, se expressa a dor da perda de um amigo “Choro por Enkidu, meu amigo”. O luto é um processo único, universal e natural. Entender isso como algo normal, haja vista que em nenhum momento queremos estabelecer normas, mas sim mostrar que a morte é uma possibilidade e uma certeza de vir acontecer com todos os seres vivos. Quando dizemos que é normal sentir raiva, culpa, sentir a presença do morto, procuramos responder para os enlutados que isso não os tornam diferentes.

 

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Inveja

Por Luciana Saddi
15/08/13 11:19

É uma atitude bastante familiar ao homem, segundo a grande analista de bebês e crianças, Melanie Klein. Ela estudou os impulsos destrutivos desde as primeiras relações do bebê com a mãe e considerou a agressividade como sendo inata, embora com intensidade variável de pessoa para pessoa, dependendo de fatores constitucionais como voracidade, angústia e de fatores externos como frustrações, privações e até agressões.

A inveja é um sentimento raivoso contra alguém que possui ou desfruta algo desejável.  Sofremos ao ver o outro possuir o que queremos para nós. Sendo assim, o impulso invejoso prevê tirar ou destruir algo de bom que o outro tem.  Ocorre numa relação dual e tem efeito deletério sobre o desenvolvimento da capacidade de usufruir a felicidade.

O invejoso passa mal ao ver a fruição da alegria alheia. Transforma admiração em escárnio.  Sente-se à vontade apenas com o infortúnio dos outros e tem necessidade imperiosa de desvalorizar tudo e todos, portanto, não há como satisfazê-lo, os esforços são vãos porque ele não consegue sentir nada de bom vindo de alguém.

Para o escritor, Chaucer, a inveja é o pior dos pecados porque todos os outros atacam uma virtude, mas a inveja ataca todas as virtudes, é contra tudo que seja bom.

Uma paixão vil e altamente destrutiva que pode prevalecer quando o ódio e o ressentimento não cedem espaço ao amor e à gratidão. Reconhecer as qualidades alheias, suas vitórias e mesmo posses não é muito fácil para ninguém. Uma pontada de inveja parece nos acompanhar inúmeras vezes, mais do que aguentamos admitir.  Circunstâncias infelizes e frustrações excessivas no decorrer da vida despertam inveja e ódio, sem dúvida, mas a forma como vivemos isso difere enormemente de pessoa para pessoa.

A felicidade depende da capacidade de reconhecer as qualidades do outro e de poder amar, inclusive amar o que não se tem, depende de boa dose de generosidade,  são esses fatores internos, muito mais do que de gratificações eventuais, que fazem toda a diferença.

 

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Não use os filhos para atingir seu ex-cônjuge

Por Luciana Saddi
14/08/13 09:56

Fale Comigo na Folha Multimídia

Medeia é a personagem trágica e vingativa de Eurípedes. Astuciosa, mata a nova mulher de seu ex-marido Jasão, oferecendo-lhe um lindo vestido banhado em veneno. Na sequência, Medeia assassina os próprios filhos.

Segundo a psicanalista Luciana Saddi, a ação não ocorre porque ela estava enlouquecida com o abandono, e sim pela “ânsia de provocar um arrependimento sem fim, um tormento insuportável chamado culpa, naquele que ousara abandoná-la”, explica.

A especialista aproveita a arte para falar da falta de cuidado, da negligência, do abuso e do uso com que muitas mães e pais tratam os filhos na hora da separação.

“Nenhum abandono, nenhuma forma de separação conjugal, por mais terrível que seja, justifica colocar os filhos em situações daninhas e prejudiciais para atingir o ex-cônjuge”.

http://www1.folha.uol.com.br/multimidia/podcasts/2013/08/1325228-luciana-saddi-nao-use-seus-filhos-para-atingir-o-ex-conjuge.shtml

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