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por Luciana Saddi

Perfil Luciana Saddi é psicanalista e escritora

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Ich bin Adolf

Por Luciana Saddi
13/09/13 10:51

escrito por  J. B. de Souza Freitas

O aniversário de 70 anos da II Guerra Mundial tem propiciado a divulgação dos mais variados documentos referentes ao conflito. Tais os exemplos dos excertos a seguir, constantes de biografia não autorizada, a ser publicada por um consórcio de editoras do Azerbaijão, com data de lançamento ainda não definida. A versão completa em alemão gótico encontra-se disponível em www.zweitweltkrieg.hi.com

 

Nasci na cidade de Braunau am Inn que, posteriormente, em minha homenagem, passou a se chamar Braunau am Inn.

#

Infância, fase terrível. Tenho já quase seis anos de idade e ninguém ainda acredita em mim.

Vou deixar crescer um bigodinho.

#

Minha terceira semana de aula.

Uma força irresistível me levou a fazer um discurso aos coleguinhas, no qual lhes disse da necessidade urgente de um expurgo em nossa classe, no sentido de limpá-la da presença de representantes das raças inferiores.

Fui pilhado pelo mestre, que me deu um tapa no pé do ouvido, ao mesmo tempo em que exclamava: “Adolf, seu psicoticozinho!”.

Desastrado educador. Um dia Eu o despacharia para Treblinka.

#

Natal. Ganhei de presente um revólver de espoleta.

Destrocei-o a marteladas. Eu tinha pedido um canhão de 88 milímetros.

#

O diretor da escola me chamou hoje em seu gabinete.

Disse-me que não tenho jeito para línguas, sou fraco em ciências e história e péssimo em matemática.

− O que você pretende fazer da vida, menino?

Respondi-lhe que desejava ser artista, um grande pintor.

− Só se for um grande pintor… de paredes! – uivou ele, caindo numa gargalhada que fez balouçar seus 120 quilos de banha.

Gordo e balofo idiota. Em 1941 ou 42 estaria reduzido a pouco mais de 30 quilos de pele e ossos em Maidanek.

#

Com a certeza de ganhar, investi todas as minhas economias num bilhete inteiro de loteria.

Já sei até o que fazer com a grana. Compro um chalé nas montanhas, um apartamento em Berlim e passo a me dedicar somente a pintar e a gozar a vida.

#

A má sorte me persegue. Não ganhei nada. Sequer o mesmo dinheiro do bilhete. Acho que vou entrar na política.

#

Lancei as bases de um novo partido. Se pegar, estou feito.

#

Me encanaram. Justo agora que as coisas estavam começando a engrenar.

Mas já decidi o que farei na prisão com meu tempo livre (eh, eh, boa essa, hem!). Escreverei.

Tenho dúvidas apenas sobre o quê? Poesia. Um romance de aventuras à la Karl May? Um longo ensaio, recheado de referências e notas de rodapé?

#

Resolvi. Vou mandar ver um livro misturando ficção, política, economia, direitos do poder, teorias raciais, autoajuda e o diabo a quatro. Sobretudo o diabo a quatro.

O título tem de ser forte e sugestivo: Da prisão ao panteão? Melhor, Com vocês, Eu! Ou, talvez, Minha epopeia chegou. Quer saber, o editor que se vire.

#

Um povo, uma nação e um guia.

Ein Volk, ein Reich, ein Führer.

É isso aí, pessoal!

E o Führer sou Eu.

#

Dei hoje início à II Guerra Mundial.

Desta vez, ou vamos ou rachamos!

#

Pesquisam, abrem túneis e cavam buracos como marmotas para descobrir ouro, o vil metal amarelo.

Meu método e simplicíssimo e facílimo. Vou buscá-lo logo na fonte.

Isto é, nas obturações dentais de todos os impuros não-arianos.

#

Ordenei que administradores, gráficos, redatores, revisores e entregadores do semanário Herrenvolks fossem removidos para Birkenau.

Em sua última edição, o jornal estampou a palavra Führer em caixa-baixa e sem o devido trema.

#

O Papa é um chato. Mas como se veste bem.

#

Lá se foi minha esperança de trocar selos com Roosevelt.

Declarei guerra aos Estados Unidos.

#

Um cientista do nosso centro de pesquisas, Von Braun, apresentou um modelo de foguete que, segundo ele, tanto serve para ir para a Lua como para bombardear a Inglaterra e acabar de uma vez por todas com as discurseiras do Churchill.

Garanti-lhe que tudo bem. Senãozinho, porém: se o foguete não chegar nem em um lugar nem em outro, ele é quem fará uma viagenzinha para a frente oriental, ver como é bom ser bucha de canhão.

#

Abri uma conta numerada na Suiça.

Como dizia minha avó: quem guarda, tem.

#

Meu xará¹ fez questão de vir comunicar pessoalmente a 500.000ª execução no campo que atualmente supervisiona.

Muito gentil da parte dele.

(¹Trata-se, sem dúvida, de Karl Adolf Eichmann.)

#

Depois de dobrar a União Soviética, invadirei a América.

O plano está traçado. Será levado a efeito num domingo de verão.

Trinta divisões serão transportadas sigilosamente para Nova York. Ali, depois de um curso rápido de inglês – indispensável para qualquer eventualidade −, os homens serão distribuídos por todo o país.

No domingo, dia D, quando a americanada estiver feliz da vida fazendo churrasquinho de hambúrguer no quintal, meu pessoal começará a entregar telegramas que dirão simplesmente: “Tua mãe morreu. Venha imediatamente”.

Em menos de uma hora, creio, o país inteiro estará convulsionado.

#

Pode haver coisa mais brega que aquele bigodão do Stálin?

#

Vou completar 50 anos e es ist ein Hundewetter!²

Compus e cantei para o pessoal do bunker uma cançãozinha que começa assim: “Ninguém sabe a dor que eu sinto, dentro de miiim…”.

(²No original. Corresponde mais ou menos a “o tempo tá ruim pra cachorro”.)

#

Nessa altura do campeonato, vem a Eva reclamar que seu lápis para sobrancelha está reduzido a um toquinho.

#

Os russos estão chegando em Berlim.

Os americanos estão chegando em Berlim.

Todos os Aliados estão chegando em Berlim.

Desta vez eles não escapam.

#

Afirmei que o III Reich duraria 1.000 anos.

Durou 12 anos e 4 meses.

Errei por 9 séculos, 87 anos e 8 meses.

# #

 

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