Recalque
13/03/13 09:42Internauta: Ultimamente, as pessoas que encontro utilizam a palavra “recalque” para todo tipo de reação ou sentimento, mas quando questiono o que querem dizer com isso falham nas explicações. Não quero te pedir para explicar o significado de “recalque”, mas gostaria de um comentário seu sobre o uso leviano de termos psicológicos como recalque, depressão, complexo, etc.
Luciana: quando Einstein formulou a teoria da relatividade jamais imaginou que o mundo viesse a empregar expressões como: tudo é relativo. O mundo se impregnou de Einstein, de ciência e de física – pela maravilha das ideias e pela facilidade de acesso ao conhecimento. Segundo o biógrafo Walter Isaacson, Einstein foi o primeiro cientista celebridade da história.
Muitos racistas – o nazismo inclusive – proclamaram a superioridade da raça e outras imbecilidades monstruosas em nome de uma das mais lindas sacadas de todos os tempos: a teoria da evolução das espécies. As ciências humanas também se impregnaram de Darwin. O neodarwinismo social é uma prova do contágio.
Com a Psicanálise ocorreu fenômenos semelhantes aos citados acima. Popularmente e com naturalidade falamos de inconsciente, complexo de édipo e fantasias sexuais ou explicamos certos comportamentos (os mais bizarros) pela teoria do trauma infantil. Orientação sexual faz parte do currículo escolar. Há influência das ideias de Freud até na exploração comercial da sexualidade. Acompanhamos psicanalistas se tornarem personagens de novelas e seriados.
Teorias científicas se entranham no tecido social. Sentados em frente à TV ou em frente aos computadores acessamos todas as informações do mundo! A sociedade de massa de consumo (sociedade do espetáculo, da informação, do vazio, etc) se caracteriza por esse tipo de ação ao devorar conceitos científicos complexos e transformá-los em balelas. É o preço que pagamos pelos ideais iluministas de universalização do conhecimento. Prefiro o mundo assim, melhor assim, do que um mundo onde os doutos superiores detenham o conhecimento. Melhor um mundo com gente que acredita que sabe alguma coisa do que um ignorante de vez.
Imperdoável é um psicanalista não saber o que é recalque, seria como um físico não entender da teoria da relatividade ou um biólogo que nunca leu Darwin.
Recalque é mais um desses complexos conceitos psicanalíticos, mas para consumo popular traduza por reprimido inconsciente!
EU ETIQUETA
Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome… estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou – vê lá – anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.
Aurea Rampazzo, coordenadora das oficinas de criação literária do Museu Lasar Segall, escolheu o poema para essa pergunta/resposta.
A biografia, Einstein: sua vida, seu universo, de Walter Isaacson mostrará um cientista preocupado com seu tempo, com a guerra e com o mundo, dominado por conflitos emocionais e genial.
Sensacional!
Boa noite sra. Luciana!
Recalcado, segundo os doutos, é todo aquele iletrado autodidata, já os autodidatas afirmam que recalcado é todo aquele que julga ser o único guardião do conhecimento.
…para o consumo popular…
Bom texto, Luciana! Linda poesia…
Difícil é nos livrarmos dos recalques que o curso da vida nos impõem.
Luciana, sua resposta foi extremamente arrogante no meu entendimento. Parece coisa de crítico de cinema, que não conta as regras da arte que domina apenas pra dar cursos de crítica e vender seu trabalho. Tudo bem que é justo receber por um serviço prestado, porque ninguém se alimenta de vento, mas nesse caso era algo simples. Se vc sabe solucionar uma dúvida, porque ao menos não vendeu isso, se te custa caro? Recalque é uma das poucas teorias freudianas que explica bem porque vai na origem e não se limita ao desconhecido. Não sei como vc consegue acreditar nesse senhor que não vai além… Não sinto pena, nem estou descontando em vc minha raiva, mas realmente não consigo entender como o materialismo pode sobreviver por tanto tempo e ainda existirem questões sobre feminismo, como se isso já não tivesse sido amplamente discutido pela filosofia oriental. Realmente o ocidente deveria se limpar e perceber que de nada adianta ter conhecimento, como os proprios iluministas falaram, se não for pra difundi-lo. De nada adianta usar algo para o bem proprio sem pensar no bem comum, porque é justo, na maioria das vezes, que todos saibam de tudo, ou ao menos tenham o direito de poder acessar isso. Então, proponho que vc explique melhor, com um resumo, sobre o recalque. O propósito do blog é esse, não?