Quem somos?
28/11/12 10:58Perguntas como essa nos acompanham desde cedo, pois temos necessidade de encontrar algumas definições sobre nós mesmos e de criar algum contorno para o eu. Precisamos de respostas, porém, toda definição pode se tornar estática, autoritária ou perder legitimidade, pois a experiência de viver implica em transformação, em passagem do tempo e movimento. Estamos mais para casas- fantasmas, habitadas por desejos alheios, por forças incontroláveis e pela história, do que para casas de bonecas com suas miniaturas inanimadas, dispostas a representar uma vida perfeita.
Ao nascer somos meninas ou meninos. Filhos de sicrana e beltrano. Loiros, morenos, gordos, magros, santistas, palmeirenses. Amados pelos pais, vistos como verdadeiros messias ou órfãos, rejeitados ou adotados e até, extremamente queridos por uma avó. Alguns vivem sem posição definida na família e sem família também. Outros são amarrados em enredos familiares opressores e acatam desígnios. Há também os questionadores que procuram escapar de alguma rede ardilosa de sentido. Desde cedo, teias nos enredam: bons alunos, esportistas, preguiçosos, corajosos, briguentos, mimados. Hetero ou Homossexual? Glutão, obediente, questionador… tantas definições passam por nós. Sedentos, procuramos respostas em revistas, horóscopos, cartomantes. Diga-me quem sou. As respostas não são universais, dependem da posição, dos desejos e do humor de quem se relaciona conosco: professores nos descrevem nos boletins, chefes avaliam, amigos elogiam e pais criticam – é frequente estarmos aquém dos desejos deles. As grandes verdades sobre nós são como mutantes sem aperfeiçoamento genético, morrem, transformam-se, renascem e morrem. Sobram restos, empoeirados ou polidos. Ficam manequins a serem vestidos por novos relacionamentos. Identidade e desejo se confundem. E assim vamos acreditando e desconfiando que sabemos quem somos e quem não somos.
Até que uma discrepante vontade insista em dar as caras, que um sonho revele algo extremo, que o medo da morte se imponha ou que um compulsivo desejo sexual perturbe a ordem estabelecida. As doenças, as perdas, os momentos em que nos sentimos postos à prova, demonstram que quando a rotina psíquica é quebrada habitantes escondidos aparecem para assombrar a casa. Fantasmas passam a conviver com os vivos, reivindicam posição de supremacia ou são conjurados por forças ocultas a voltarem aos seus esconderijos. E a desordem é instaurada… Por anos acreditamos em quem achamos que somos e, um dia, a casa cai. Somos destroços, terrenos baldios, casas reconstruídas, em reforma – depende da vastidão da ruptura.
Análise de uma analisante
Tenho que me parir
essa dor toda
são as contra-ações
desse parto.
Parto!
Tenho que partir
e não, voltar
pra quê voltei ?
pra quê visitar esse lugar ?
essas pessoas ?
essa infância ?
Parto!
Amá-la está quase pronta
meus tecidos
minhas linhas
meus cadernos de estórias
minhas tintas
minhas tê-las
télas todas
minhas panelas vazias
Minha dúvida.
é como matá-lo
não consigo…
Sinto que tenho que matá-lo
para que ele me deixe ir.
Pra bem longe
onde essa estória
vai estar só no caderno
Ele e ela ficam
na casa velha.
Tchau !
Parto !
Vou ver o mundo
vou ver as cores
lá tem gente
que eu não preciso
querer machucar.
Ele e ela ficam
na casa velha
cheirando mofo
fritura
miséria espiritual
cheiro de porra
de urina velha no colchão
revistas pornográficas
cheias de porra e cupim
o sofá de suor, fedendo
cheiro de sangue na pele
cheiro de choro, contido.
A casa caiu!
E não
é possível
morar
em escombros
Luciana,
Gostei Muito do Seu Texto!
Essas questões existenciais sempre mexem com a gente.
Recentemente escrevi um artigo cujo título é “A condição humana: uma metáfora”. Creio que possa servir como uma leitura complementar ao teu texto, para aqueles que se interessam por artigos dessa natureza; o artigo pode ser encontrado através de uma simples busca no google…
Um Beijo! Jorge Xerxes
quer que eu poste aqui? me envia…