Felicidade
30/10/12 12:03Nos consultórios dos psicanalistas é comum escutarmos pais – apreensivos com o desenvolvimento de seus filhos – dizerem que desejam, apenas, que os pequenos sejam felizes.
Há muito se tornou lugar comum justificarmos atitudes e crenças em nome da felicidade, mas o que será que ela significa?
No século XVIII os filósofos iluministas pretenderam substituir a ideia de salvação pela de felicidade na terra. Os dogmas de Paraíso e Vida Eterna como compensação pelos sofrimentos da existência foram, então, rechaçados. O Homem moderno exigiu sua cota de vida digna e prosperidade em vida.
A providência divina foi substituída pela certeza científica. Vieram as ideologias do progresso que prometeram: a satisfação de nossos desejos e a utopia.
Nosso tempo prescreve um dever de felicidade cada vez mais uniforme e exagerado.
Se ser feliz aqui e agora era o mandato impossível da modernidade, o que dizer de um mandato de gozo permanente, característica do nosso tempo!
As consequências são visíveis, nos tornamos indiferentes ao mundo. Numa sociedade narcísica confundimos consumo com completude. E frustração se torna ressentimento. Acreditamos merecer tudo e um pouco mais, como se fossemos as vítimas a esperar ressarcimento pelos direitos negados. A posição de coitados é marca dos nossos dias, difundida entre adultos, jovens e crianças.
Vitimas a exigir reparação, eternos demandantes – ainda que nada no mundo possa alterar certas faltas ou oferecer satisfação plena. Vítimas passivas que reclamam e não se responsabilizam pelos próprios atos nem destino.
Cuidado, seu filho ou filha pode estar crescendo em ambiente permeado desses valores. Foi você quem os propagou, sem perceber. Por isso testemunhamos o aumento das compulsões, das adições a drogas e de infantilismo em adulto. Sintomas decorrentes da ideologia do gozo.
Nenhum psicanalista poderá garantir satisfação permanente com a vida. Não somos técnicos da felicidade. Uma análise pode promover autoconhecimento e responsabilidade. Propicia um encontro singular, sem máscaras. Uma aventura que favorece o desenvolvimento de autonomia, permitindo surgir pensamento e julgamento próprios.
Dá próxima vez que assistir alguém propagar com pompa o direito a ser feliz, desconfie.