Lamentar, enlouquecer de dor e chorar é importante para a elaboração das perdas
15/08/12 10:05O Luto é tão importante na história da civilização que as urnas funerárias datam dos primórdios do Homem e os rituais de enterramento são anteriores ao tabu do incesto.
O luto é um estado psíquico tremendamente doloroso, está associado ao trabalho de elaborar a morte e as perdas.
Experimentamos perdas quotidianamente. Ao ler um livro agradável sei que o prazer da leitura irá durar até acabar de lê-lo. Quando acabar o livro terei que me separar dele. Perco o livro e o prazer. O deleite que experimentei ficará guardado apenas na memória, como lembrança. Uma dose de nostalgia pode aparecer.
Posso começar uma nova leitura, um novo livro substitui o anterior, outra dose de nostalgia pode se fazer presente, pois não posso experimentar os mesmos sentimentos que tive ao ler o primeiro livro. Os sentimentos que tive e o tempo que foram vividos não retornam, se foram. E, se acaso reler o primeiro livro extrairei dessa experiência outras emoções. Convivemos com o luto enquanto convivemos com a vida.
Procuramos, muitas vezes, a satisfação total. Nessa procura nos deparamos com um vazio sem fim. É impossível nos sentirmos totalmente completos por muito tempo. Cada novo amor traz a promessa de satisfação completa, por isso revivemos um luto a cada relação.
Nas perdas de relações significativas, como a morte de um ente querido, o trabalho de luto é mais intenso e penoso. Luta-se contra duas situações dolorosas ao mesmo tempo: a falta de quem se ama e o reconhecimento da inevitabilidade do próprio fim. A nostalgia se intensifica. A dor insuportável pode levar a reações de fuga da realidade, seguida por busca de triunfo pessoal, perseguições e acusações descabidas ou pode levar a um abandono de si mesmo, com pensamentos autocríticos intensos, além do agravamento da depressão e dos estados melancólicos, na tentativa vã de reviver quem já não mais existe.
A dor pode amenizar com o tempo, mas não é sábio generalizar crenças, pois o tempo da amenização varia de acordo com a qualidade da perda e com a dor imposta. Algumas se intensificam no período que sucede imediatamente à perda e devem ser vividas assim. O tempo não é o fator que conta para sua diminuição. A dor diminui pelo lento trabalho de elaboração do luto.
É preciso lidar com o vazio deixado pela ausência. Por isso, é imprescindível que se preserve um espaço para viver a dor da perda, espaço cada vez mais difícil de ser preservado.
Lamentar, enlouquecer de dor, falar e chorar são fatores importantes no processo de elaboração das perdas. Ficar “mal”, seja porque motivo for, contraria a exigência de excelência de desempenho imposta pela sociedade ocidental. Temos que parecer eternamente jovens, bonitos e bem sucedidos. Essa exigência nega o direito à tristeza e destrói o espaço para viver a dor da perda.
É mais fácil escutarmos de amigos que a vida continua, que devemos nos distrair, do que contar com sua disponibilidade para ouvir nosso lamento. Parece que no mundo em que vivemos foi decretada à proibição ao luto pela perda de um ente querido.
A possibilidade de compartilhar a dor com amigos próximos é importante. A cumplicidade e permissão para viver a dor da perda, sem a exigência de sua rápida diminuição é fundamental. Quem enfrenta a morte de alguém significativo em sua vida precisa encontrar a permissão para que a nostalgia aflore a ponto de machucar.
Sem sofrimento não é possível elaborar o luto pela perda de um filho ou do companheiro de uma vida.
Supera-se o luto quando a ausência imposta pela perda se transforma em presença ausente, em lembrança experimentada sem a dor dilacerante dos primeiros tempos.
A morte é transformação, mudança, não a vejo como perda. O que falta as pessoas e conhecimento, dirija-se ao mundo não ocidental para entendimento desta transformação.
Nascer em caixas, viver em caixas, desenhar caixas, trabalhar em caixas, ser colocando dentro de uma caixa que estará dentro de outra caixa, este é o mundo….. como escreveu a REDE GLOBO num anuncio no fisl11 em POA, procuramos pessoas que pensem fora da caixa, ehehehe
Prezada Luciana. Como adorei seu texto, vivi a situação de duas perdas no periodo de quatro meses. Uma por morte e outra de uma relação muito longa. E o que vc. retratou é a mais pura verdade. Especialmente me identifiquei com a parte da amizade. Poucos foram aqueles que efetivamente eu pude encostar no ombro e simplesmente chorar. Devido a isso tenho amigos que não abrirei a mão, jamais. bjs,
Alguem só é alguem,guando encontra um alguem!!!