Sobre a perda da minha alma gêmea
10/08/12 09:40Trecho do belíssimo ensaio de Montaigne, que trata da amizade e morte de seu melhor amigo, La Boétie.
“…Desde o dia em que o perdi, dia que nunca deixarei de ver como um dia cruel e nunca deixarei de honrar – essa foi vossa vontade, ó deuses! (Virgílio) não faço mais que me arrastar languescente; e os próprios prazeres que se me oferecem, em vez de consolar-me, redobram a tristeza de sua perda. Participávamos a meias de tudo; parece-me que estou roubando sua parte, E decidi que já não devia desfrutar prazer algum, já não tendo aquele que compartilhava minha vida. (Terêncio) Já estava tão afeito e habituado a ser um de dois em tudo que me parece não ser mais do que meio. Já que um golpe prematuro arrebatou-me aquela metade de minha alma, por que eu, a outra metade, continuo aqui, eu que estou desgostoso de mim mesmo e que não sobrevivo por inteiro? O mesmo dia perdeu-nos a ambos. (Horácio) Não há ação nem pensamento em que eu não sinta sua falta, assim como ele teria sentido a minha…”
Michel de Montaigne, Os Ensaios, livro I, editora Martins Fontes, São Paulo, 2002. Da amizade, 273 -291