Esposa bipolar
11/06/12 10:39Internauta: Sou casado há 10 anos, minha esposa sempre foi honesta comigo sobre sua doença, mas eu não tinha dimensão do que era a bipolaridade. Não consigo tratá-la como tal. Tenho dificuldade em aceitar a doença, porque uma hora ela está bem outra não. Fico quase louco. Durante o período menstrual, tudo se intensifica, inclusive agressões verbais ao nosso filho de sete anos. Nossa situação financeira e relacionamento são como uma eterna montanha russa emocional. Creio que se mudar meu comportamento ela permanecerá estável. Gostaria de receber um conselho, às vezes, uma frase muda toda a perspectiva.
Luciana: Não aceitar que sua esposa sofra de uma doença mental é condená-la e à família a viver num círculo vicioso, dentro de uma montanha russa. Há preconceito nessa atitude.
Ter uma doença física crônica – como a diabete que obriga a cuidados com a alimentação, injeções de insulina e medidas constantes no sangue – exige estarmos em permanente estado de alerta. Muitos diabéticos negam a doença ou não aguentam o peso da obrigação de tantos cuidados e restrições. Dá trabalho ser doente. Ter uma doença mental é ruim, talvez um pouco pior que ter uma doença física, porque é muito mais difícil perceber-se doente e se cuidar corretamente. A loucura (me permito usar esse termo de forma livre e sem preconceito) faz o doente negar seu estado mental e a realidade. A família tem um papel muito importante para ajudar quem está doente a se tratar. A doença mental dá muito trabalho para as famílias.
Agora, some o trabalho ao preconceito medieval contra problemas mentais e você verá que o desamparo de quem sofre com esses problemas é terrível. O descrédito não permite buscar tratamento adequado, nem medicamentoso nem psicoterapêutico. Há drogas potentes que trazem maior estabilidade para os que sofrem de alteração de humor e terapia familiar que ajuda a família a reconhecer e cuidar do problema de forma rápida e adequada. Seu filho deve acreditar que o problema é dele, quando a mãe o agride. Ele ficará muito aliviado ao saber que as agressões são fruto de uma doença dela e não são ataques pessoais, que ele não fez nada de errado. Talvez a perdoe ou talvez não cresça culpado demais. O mesmo vale para você – onipotência sua acreditar que a alteração de humor dela depende do seu comportamento!!!
É sabido que muitas pessoas sofrem de doenças mentais, a incidência na população parece ser igual ou maior que a incidência de doenças cardiovasculares. Mesmo assim nos envergonhamos ou negamos que parentes e amigos sofram psiquicamente.
Fundamental é perceber que nenhum de nós, jamais, poderá ser igualado a uma doença mental. Cada um adoece à sua própria maneira e é maior que a doença. Temos nossa graça e nosso jeito de ser e podemos ser adoráveis apesar da bipolaridade ou da depressão.
Esta espécie de loucura
Que é pouco chamar talento
E que brilha em mim, na escura
Confusão do pensamento,
Não me traz felicidade;
Porque, enfim, sempre haverá
Sol ou sombra na cidade.
Mas em mim não sei o que há.
Fernando Pessoa, In.: Cancioneiro
Poema escolhido por Ana Tanis, psicóloga, bacharel em letras e curadora de poesia desse blog.
Dica: No filme, Mr Jones, de Mike Figgs, observamos quão devastadora é a doença bipolar. Um homem oscila entre a autodestruição depressiva e a maníaca. Na fase maníaca está cheio de amor para dar, mas pode se tornar agressivo e raivoso. Na depressiva se odeia. Como dizia um antigo mestre, a doença é sempre uma abstração conceitual, o que existe são os doentes.
esse depoimento me emocionou, pois trouxa a tona muitas lembranças. cersci com mãe bipolar e meu pai, ao contrário do leitor, não sabia o que fazer e não buscou ajuda. era a virada da década de 80 para 90 e não tínhamos internet, e na minha casa a psicologia era um tabu, “coisa de maluco”. cresci muito marcada pelo abusos verbais da minha mãe, por isso te parabenizo por buscar ajuda enquanto seu filho é novo. se a mãe dele buscar uma terapia agora ele, ao contrário de mim, não precisará de terapia no futuro.
e esqueci de comentar que, luciana, sua resposta foi péssima. sermão não, né? quem está de fora não sabe como agir. tenha sensibilidade e enxergue entre as linhas. o leitor pede um conselho, não um puxão de orelha. ele quer ajudar, apenas não sabe como. vc como profissional, tem as ferramentas para guiá-lo em busca de uma solução mas preferiu tirar conclusões antecipadas. achei vergonhoso.
Atuei, faz pouco, como cuidadora de uma pessoa de minha família com transtorno bipolar:- casada, com dois filhos pequenos, enfim, um misto de complicação com sofrimento para todos os envolvidos! Foi muito mas muiiiiito sofrido mesmo, mas felizmente ela caminha em direção à melhora. Está medicada, assistida por psiquiatra, já retomou sua rotina e em breve deverá retornar à terapia.
Vou resumir a minha opinião ,da seguinte forma: – os psicólogos e psiquiatras precisam esclarecer à população , mediante emprego de linguagem simples, sobre tudo que cerca não só esse, mas qualquer transtorno mental, da mesma maneira que os cardiologistas fazem, por exemplo, com a questão do sedentarismo. Explico: – Há, na nossa sociedade, um apelo excessivo à tolerância ao outro, enquanto virtude. E isso se mistura e se esbarra de uma tal forma na cabeça da gente, a ponto de nos impedir até de verbalizar a suspeita de que um eventual desarranjo psiquiátrico possa estar se instalando em determinada pessoa. Geralmente, a pessoa que dá o alarme, fica vista como desumana, exigente, etc…
Fica a dica para a Dra. Luciana. Espero que você aborde o assunto com maior frequência.
vou tentar, obrigada pela dica!
Sou bipolar tipo II e me trato desde 2005. Me separei do meu primeiro marido e tenho guarda do meu filho. Tive um companheiro logo que comecei meu tratamento e a relação não prosperou. Não é fácil conviver com alguém com transtorno de humor mas acredito que é preciso em primeiro lugar separar a pessoa da doença, incentivar a aderência a um tratamento medicamentoso e psicoterapêutico contínuo por profissionais competentes e vou avisando que isso não é barato e o sistema público de saúde é de pouca ou nenhuma ajuda. Meus remédios e minha terapia são minha cesta básica! Assim eu consegui prestar concurso e passar, sustentar meu filho, ter equilíbrio para cuidar dele, namorar, e com os altos e baixos ir em frente. Não é fácil no início, mas depois entramos no ritmo. Família é importante mas de maneira geral o preconceito das pessoas, inclusive do próprio paciente atrapalha. O leitor precisará de terapia também se quiser ficar com essa mulher e isso não será ruim, pelo contrário! Será um processo de descobertas, uma jornada pessoal. Crises são oportunidades de crescimento e se para a esposa dele a doença é para sempre, para ele a doença dela é uma outra coisa, uma oportunidade de crescer junto, talvez. Há muitas chances dessa mulher ser uma boa mãe desde que tratada, e que o filho seja feliz com ela como o meu é comigo. Apenas lembre que doença não dá em poste e doença psiquiátrica não é fraqueza, é fatalidade e não tem cura mas pode ter controle e ser perfeitamente possível uma vida produtiva! Amor é fundamental. Boa sorte ao leitor.
Conheço bipolares que fazem tratamento e levam uma vida praticamente normal. Mas também existem aqueles que negam a doença e recusam qualquer medicação.