Ressentimento e rancor

Por Luciana Saddi

25/05/12 11:47

Internauta: Nossa relação sempre foi de idas e vindas. Ele dizia que ia na feira, mas ia para o bar. Terminamos, mas ele ficou atrás de mim e resolvi lhe dar uma chance. Fazíamos planos de casar quando descobri que me enganava com outras mulheres. Passei tanta raiva…agora estou até aliviada.

Escreva pra mim, estou aguardando que você organize meus sentimentos.

Luciana: Nos anos 80 fiz um estágio no hospital psiquiátrico do Juqueri. Conheci Flores, uma interna, que só odiava. Ela sentia tanta raiva que não parava de xingar nem para dormir ou comer. Ninguém conseguia se aproximar fisicamente dela ou entabular uma conversa. Os médicos diagnosticaram um episódio maníaco muito acentuado. Psicose bipolar com forte característica paranoica. Após meses, muito magra e abatida, ela continuava agitada, com raiva, andando de um lado para o outro sem parar e gritando. Mas já era possível trocar algumas palavras, no entanto, se nos aproximássemos fisicamente dela, gritava: sai encosto.

Ser enganado dá muita raiva. Ser enganado no amor parece pior ainda. É pior porque a “porta da esperança“ fica aberta para todas as ilusões. Ou seja, somos nós que ajudamos os outros a nos ludibriar.

O amor não salva não cura nem muda as pessoas. Para que isso ocorra é preciso um forte investimento de quem deseja se modificar. É melhor amargar uma desilusão e esperar que o ódio passe. Você estará sujeita ao ressentimento e ao rancor – cuidado. Esses sentimentos estavam na Flores em altos decibéis. Nos neuróticos (a maioria de nós) operam em volume baixo, mas tão constante quanto num psicótico.

Amortecedor

                    Amor-tece-dor
                   Amortece-dor
                    A-morte-tece-dor

Paulo Bruscky

Poema escolhido por Ana Tanis, psicóloga, bacharel em letras e curadora de poesia desse blog.

Dica: As Brasas, romance de Sándor Márai. O reencontro de dois amigos, Henrik e Konrad, 41 anos depois. Um segredo ronda o dia em que a vida deles mudou e está relacionado à Kriztina, mulher por quem ambos se apaixonaram. O ressentimento tem vida longa.

Comentários

Gilvano comentou em 25/05/12 at 12:22

Luciana, será que “o amor não salva não cura nem muda as pessoas”? nem mesmo contribui? Como assim?”são a fome e o amor que movem o mundo”( Freud cita Schiller em O Mal-Estar na civilização)
- Luciana Saddi comentou em 27/05/12 at 12:40
  
  me pegou!contribui, sim. Radicalizei, sorry. O amor é a força mais linda que temos, mas nao devemos idealizá-lo. Muitas pessoas acreditam que se elas amarem alguém , esse alguém irá mudar…quase nunca issoa acontece.
  - Fernando comentou em 28/05/12 at 20:27
    
    Há muito ouço falar a respeito da idealização que fazemos do amor. Mas como não cair nesta cilada? Gostaria de saber mais a respeito disso.
ailton comentou em 25/05/12 at 23:06

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Ana comentou em 27/05/12 at 10:16

Luciana,
você poderia falar um pouquinho sobre misoginia, especialmente causas e cura? Agradeço.
- Luciana Saddi comentou em 27/05/12 at 12:41
  
  vou tentar, em breve!
Julia comentou em 27/05/12 at 10:21

O difícil é não se contagiar com o ressentimento, com a dor, parece que tudo gira em torno da ferida nunca cicatrizada. Tenho um relacionamento onde a ferida esta constantemente sendo aberta, e vou falar pra vocês, é barra viver assim, e não consigo me libertar ou melhorar a situação.
- Luciana Saddi comentou em 27/05/12 at 12:42
  
  vou escrever sobre o ressentimento em breve!
sergio comentou em 10/07/12 at 12:04

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